Denize Dutra
Consultora Sênior do Instituto MVC
Professora dos MBAs da FGV
Para que este artigo faça sentido,
necessito começar citando um dos maiores poetas brasileiros, Carlos Drumond de
Andrade:
“ No meio do
caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra
no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do
caminho tinha uma pedra.
Nunca me
esquecerei desse acontecimento
na vida de
minha retinas tão fatigadas.
Nunca me
esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra
no meio do caminho
no meio do
caminho tinha uma pedra”.
Usando a inspiração do poeta quero
compartilhar minhas reflexões a respeito de algumas experiências pessoais e
profissionais sobre a nossa capacidade para lidar com as muitas pedras do nosso
caminho. Contudo, não vou me referir especificamente à motivação necessária
para não desistir de caminhar, e sim, ao que hoje estamos chamando de
resiliência. Este termo, oriundo da engenharia, refere-se à capacidade de
determinada matéria resistir a determinadas condições, mantendo as mesmas
características originais, ou seja, a sua essência, a sua integridade.
Esta capacidade também foi denominada
por Paul Stoltz, de QUOCIENTE DE ADVERSIDADE – vulgo, QA. Se entendermos que as
pedras no caminho são as adversidades naturais em nossa existência, podemos
analisar qual a necessidade de desenvolvermos esta importante competência
emocional para sermos bem sucedidos, tanto no mundo dos negócios, como na vida.
Cabe esclarecer que, quanto mais
elevado o QA, mais controle interno e espontâneo sobre as suas emoções a pessoa
terá. Em contrapartida, quanto menor o QA, menor controle emocional, que pode
se manifestar em descontrole e explosões emocionais e até atos de violência. O
baixo QA também se relaciona ao processo de vitimização: quanto menos a pessoa
sente-se capaz para enfrentar as adversidades, mais ela precisa colocar-se no
papel da vítima, pois assim, ela justifica para si própria e para os demais, a
sua própria inoperância.
Para desenvolver o seu QA, o indivíduo
necessita entender que, apesar de estar acostumado a acessar determinadas
competências para responder às situações do cotidiano, na verdade, possuímos um
estoque muito maior do que aquele que comumente utilizamos. Nosso potencial
disponível é muitas vezes maior do que a capacidade acessada. O que normalmente
ocorre é que, nas situações de adversidade, tomamos como referência a
capacidade acessada e, por alguns momentos (ou não?), acreditamos que não temos
as condições necessárias para responder e reagir à adversidade. Nossa percepção
é de que a situação é mais complexa do que a nossa capacidade de enfrentá-la.
As pessoas aumentam seu QA quando conseguem ir além desta percepção restritiva,
e se dão conta de que nenhuma situação é maior do que a capacidade do ser
humano de enfrentá-la.
A constatação acima permite que o
indivíduo entenda e aceite a sua responsabilidade na solução dos problemas.
Aqui temos dois pontos críticos: - um, é que, se as pessoas não se sentem parte
do problema, certamente não se sentirão parte da solução; - o outro, é que
existe uma confusão entre culpa e responsabilidade. A culpa está relacionada à
causa do problema, a quem o provocou e a responsabilidade está focada na
solução. Ou seja, independentemente de quem causou o problema, o indivíduo
percebe que a solução depende dele.
Outro aspecto relevante diz respeito à
percepção que o sujeito tem do alcance e da duração das adversidades. Se
restringirmos o escopo da adversidade a uma determinada dimensão da nossa vida,
e também a sua duração (se a existência é finita, muito mais o serão as adversidades),
estaremos aumentando a nossa resiliência.
Não podemos imaginar que teremos
caminho sem pedras e, muito menos, que vamos, necessariamente, ter de mudar o
caminho só porque encontramos pedras; precisamos é estar preparados para
tirá-las do meio caminho. Isto me faz lembrar um dos ícones da poesia
portuguesa, Fernando Pessoa:
“Pedras no
caminho?
Guardo todas,
um dia vou construir um castelo..."
Que sejamos engenheiros de nós mesmos e
que façamos das adversidades os nossos futuros castelos! Afinal, a exemplo da
própria vida, as organizações estão cheias de pedras no caminho. Cabe-nos, como
gestores de pessoas, ajudá-las a assumirem a responsabilidade de “tirarem as
pedras de seus caminhos” ou pelo menos, aprenderem a desviar-se delas... Caminhar
é preciso!